Arquitectura wabi-sabi
- Mafalda Carmona
- 24 de jun. de 2016
- 2 min de leitura
A saudade está para Portugal como o wabi-sabi está para o Japão. A saudade é uma palavra exclusiva para a língua portuguesa e ajuda a perceber a forma como um povo sente e vive pois as palavras que usa, as expressões não traduzíveis para qualquer outra língua, definem em grande medida esse povo.
E, o modo como um povo se expressa influi na modo como vê e interpreta o mundo que o rodeia e também, ou sobretudo, as formas que cria, idealiza e constrói. Muita da arquitectura feita em Portugal é assim, essa arquitectura da saudade traduzida pelos volumes brancos e puros, pelos recantos frescos, pelas janelas projectadas sobre o interior, pela tentativa de recriar o sentimento do que está presente sem estar em fachadas de pedra ou a relembrar a história em geometrias alegóricas e evocativas, embora se diga que no presente as evocações estão fora de moda assim como as metáforas... mas a moda tem características cíclicas e portanto o mais relevante são os conceitos pois esses não passam de moda: justificam-se.
Projecto_LC2 e janelas para o mundo da saudade...

Projecto_RGB e janelas para o wabi-sabi...
Existem assim diferenças estéticas fundamentais entre as linhas direitas características da cultura ocidental, das entradas de luz proporcionadas pelas tradicionais janelas direitas e na maioria das vezes simétricas, e as formas arredondadas e assimétricas da cultura oriental que não são ditadas pela "moda" mas sim pela cultura e características de um local e de um povo.
Esta diferença poderá ter justificação na palavra japonesa wabi-sabi: Encontrar beleza nas imperfeições.
Esta palavra é o reflexo da aceitação do ciclo da vida e da morte e deriva dos ensinamentos budistas, pois é um princípio estético centrado na capacidade de descobrir a beleza nas imperfeições, elementos assimétricos e incompletos. Uma aceitação da impermanência como uma lei transcendental na qual se torna possível viver e conviver não apenas com a imperfeição do ser humano como com a insegurança perante o amanhã, aceitando o devir, dotando-o ao mesmo tempo, através da sua envolvente construída, da capacidade de se ter uma existência plenamente realizada na simplicidade e na imperfeição. Esta é uma definição mais ou menos livre daquilo que podemos encontrar numa pesquisa na rede onde algumas palavras podem ser extraídas como relevantes para uma definição de elementos que poderão ser encontrados na arquitectura do País do Sol Nascente:
"impermanência, assimetria, aspereza, rugosidade, irregularidade, simplicidade, economia, austeridade, modéstia, intimidade, integridade ingénua, processos naturais, quietude, subtileza."

Assim, cada povo ao se representar no mundo real e construído traduzido em arquitectura, pretende, mesmo que a nível inconsciente, representar-se enquanto povo e enquanto cultura.
E se é verdade que podemos beneficiar através da troca cultural e reflectir sobre a possibilidade da mais valia da fusão de influências culturais na arquitectura que se faz em Portugal, não é menos verdade que a casa de cada um de nós dirá muito, senão tudo, sobre cada um de nós...
O que diz a sua casa sobre si? E o que dizem as nossas cidades sobre nós, nobre Povo Português?
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